
Era isso. No meio de tanto lirismo, cantamos à Paulicéia o sonho de uma noite de verão... As luzes transmutavam, os objetos, que sempre representaram a absoluta solidez, estavam disformes, fora do foco. Não era tanta correria. Poucos carros, levemente frenéticos. Pessoas com sanidade mental duvidosa, e muitos olhares perdidos.
Não conseguia rir. Nem ser divertida. A idéia foi de reflexão mesmo. Pensar na formação do todo, na ocupação e interpretação do espaço... tudo teatral.
Pensei nas pessoas com quem tenho cruzado. Na essência reveladora delas. Na minha comunicação com o mundo...
Saudades das meninas. Naquele exato momento estaríamos rindo e atropelando as falas, passos rápidos, outras no ritmo de veraneio... Pensei na minha família tão polinucleada, tão reconfortante... e pesei minha ausência nunca desapercebida. Ausência íntegra e sincera, uma tentativa de me fortalecer e me resolver sozinha. Eu sinto, eles sentem, neste momento, ninguém suspira.
Era isso, exatamente. No auge da observação, da atmosfera de sonhos e bolhas mágicas de sabão, de dissoluções de imagens e sons urbanísticos, a violência. O deseqüilíbrio batendo sistematicamente à porta do país de maravilhas.
Cruzei o olhar e duvidei. Espreitei e me vi mais uma vez, sem capacidade de reação. Invasão de espaço. Perda de território? Que terra é esta? Não é minha, nem de ninguém..? Eu vivo a ilusão?
Quis correr... mantive-me imóvel. Quis reagir. Me vi encurralada, mas ainda assim, com vontade de quebrar essa coerção. Uma mistura nada fina de vontade de respirar a liberdade máxima, com o simples e humano desejo de simplesmente ter o meu espaço corporal respeitado. Minha individualidade, afinal... não tenho a intenção de agredir nada, nem nenhuma pessoa nunca.
Eis que surge a figura que sempre critiquei e duvidei Brasil afora. O velho "salvador da pátria"... o sonho paternalista enrustido. Duvidei. Desacreditei. Mas era isso mesmo... um tótem da libertação dos oprimidos. Sim..!!!! Até então, cheguei a duvidar de sua veracidade, e intenção. Infelizmente, a perda da crença no ser humano.
Sempre surpreendente esta vida. E cheia de aprendizados e livros dos prazeres. Cada flash, um capítulo intenso...
Como é bom chegar em casa. Tocar o lado basal de toda existência...
RÉQUIEM PARA UM SONHO.
(Créditos de imagem: M.C. Escher)